O sistema financeiro brasileiro está em transformação acelerada — impulsionado por tecnologias emergentes, novas demandas da sociedade e mudanças no cenário global. Nesse contexto, o Banco Central do Brasil (BCB) revelou as prioridades regulatórias para 2025 e 2026, apontando tendências que devem moldar o setor nos próximos anos.
Com foco em inovação, sustentabilidade, inclusão, segurança e eficiência, a agenda regulatória foi estruturada em 14 macrotemas estratégicos que abrangem desde Open Finance e tokenização de ativos até novas diretrizes cambiais, inteligência artificial e evolução do PIX.
Este artigo analisa as principais frentes dessa agenda, destacando as iniciativas que prometem impactar diretamente o ambiente de negócios, a competitividade do país e a experiência dos usuários de serviços financeiros.
1. Inovação: consolidando o futuro do sistema financeiro
O Banco Central segmentou o tema da inovação em cinco eixos prioritários, todos voltados ao fortalecimento da infraestrutura tecnológica e à promoção de novos modelos de negócio sustentáveis e escaláveis.
Open Finance: eficiência, inclusão e expansão de serviços
Cinco anos após seu lançamento, o Open Finance conta com mais de 52 milhões de consentimentos ativos e movimenta cerca de 3,3 bilhões de consultas semanais. Para os próximos ciclos, a agenda se concentra em dois pilares:
- Eficiência e robustez do sistema: serão adotadas medidas para melhorar o desempenho técnico da infraestrutura, com ênfase em limites operacionais, monitoramento e qualidade dos dados. O objetivo é reforçar a estabilidade e a confiança no ecossistema de compartilhamento de informações.
- Expansão funcional e novos serviços: com foco inicial na portabilidade de crédito, a agenda prevê também a inclusão da portabilidade de salário e de investimentos, em cooperação com a CVM.
Além disso, o Banco Central reconheceu a baixa adesão de pessoas jurídicas como um desafio estratégico. Por isso, estão previstas ações para melhorar a jornada das empresas, incentivando a adoção do Open Finance no segmento corporativo.
Regulamentação para o mercado de criptoativos (VASPs)
A regulação das prestadoras de serviços de ativos virtuais (VASPs) segue como prioridade. O novo enquadramento visa garantir transparência, segurança jurídica e integridade nas operações com criptoativos, alinhando o Brasil aos padrões internacionais.
Bank as a Service (BaaS)
Bank as a Service (BaaS) é um modelo de negócio em que bancos ou instituições financeiras oferecem sua infraestrutura bancária via APIs para que outras empresas possam oferecer produtos e serviços financeiros mesmo que não sejam instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil
As novas regulações previstas para 2025 determinarão a responsabilidades destas em relação às transações realizadas.
Tokenização de ativos financeiros
O BC monitora de perto as tendências globais relacionadas à tokenização de ativos, com o objetivo de preparar o país para uma adoção segura e estruturada dessa tecnologia. Essa frente se insere na busca por novos instrumentos de financiamento e rastreabilidade de ativos.
Inteligência artificial (IA): uso responsável e transparente
A regulação do uso de IA no setor financeiro também está em andamento. A proposta é conciliar inovação com ética e proteção ao consumidor, garantindo que o uso de algoritmos esteja ancorado em boas práticas de governança e transparência.
2. Câmbio e Capitais Internacionais: simplificação e integração global
Com foco na modernização do mercado cambial, o Banco Central reforça o compromisso com a eficiência e a competitividade internacional, por meio de quatro frentes estratégicas:
Compensação privada de créditos
A proposta regulamenta a compensação de créditos entre residentes e não residentes — prática prevista na nova lei cambial. O foco está na agilidade e segurança jurídica para operações de grande porte entre empresas nacionais e estrangeiras.
Operações interbancárias de câmbio
Uma consulta pública em andamento visa simplificar as regras para operações interbancárias, desburocratizando o processo e otimizando o envio de informações ao BC. Essa medida favorece a competitividade e a eficiência do mercado.
Criptoativos com natureza cambial
O avanço do uso de ativos virtuais em operações com perfil cambial exige clareza normativa. O Banco Central está em fase final de consulta pública para regulamentar essas situações, oferecendo segurança jurídica para instituições e clientes.
Revisão das normas para EFEX
Com o crescimento das empresas de câmbio eletrônico (EFEX), o BC propõe revisar regras de atuação e prestação de serviços. A medida busca criar um ambiente mais competitivo, transparente e seguro, em linha com as melhores práticas internacionais.
3. Prudencial: resiliência financeira como base para o crescimento
As diretrizes prudenciais do Banco Central para os próximos anos seguem o compromisso com a estabilidade do sistema financeiro. A agenda se concentra especialmente na finalização da implementação de Basileia III e na modernização de regras para entrada de novos players no mercado.
FRTB: fase final da implementação no Brasil
O país avança para a terceira e última etapa da adoção do FRTB (Fundamental Review of the Trading Book), novo padrão de requerimento de capital para risco de mercado. A norma substitui as abordagens tradicionais para os segmentos S1, S2 e S3, promovendo maior precisão na mensuração e mitigação de riscos, em alinhamento às diretrizes internacionais de Basileia III.
Redefinição de capital mínimo para novas instituições
A exigência de capital mínimo para as Instituições será atualizada. Os critérios atuais, definidas na década de 1990, já não refletem o grau de sofisticação das operações e inovação do sistema financeiro atual. A atualização visa garantir que novos entrantes estejam preparados para operar com segurança e solidez, impulsionando a concorrência responsável.
Essas medidas fortalecem a resiliência do sistema financeiro brasileiro, garantindo espaço para inovação sem comprometer a integridade do mercado.
4. Sustentabilidade: avanço regulatório para finanças verdes
A agenda regulatória avança também no eixo ESG, com o objetivo de consolidar um sistema financeiro mais transparente, sustentável e alinhado aos padrões internacionais.
Evolução nos relatórios de sustentabilidade
Atualmente, os relatórios obrigatórios das instituições financeiras são, em sua maioria, qualitativos. O Banco Central propõe elevar esse padrão com a inclusão de critérios quantitativos, permitindo comparabilidade, rastreabilidade e análise de impacto com maior rigor técnico. A próxima etapa será a publicação de uma minuta normativa para consulta pública, consolidando uma regulação mais robusta e contemporânea.
Contabilização de ativos sustentáveis
Também em consulta pública, avança a normatização da contabilização e divulgação de ativos ligados à sustentabilidade. O novo marco busca uniformizar como esses ativos são registrados e reportados, promovendo mais confiança para investidores e sociedade civil.
Ao promover essas mudanças, o BC posiciona o Brasil de forma mais competitiva no cenário global, contribuindo para a construção de um sistema financeiro mais resiliente à transição climática.
5. Crédito Rural: dados estruturados para impulsionar o financiamento
No setor agropecuário, a regulação caminha para um modelo mais transparente, orientado por dados e favorável ao crédito qualificado.
“Bureau Verde” e ampliação da base de dados
O “Bureau Verde”, sistema que centraliza dados do histórico de financiamento rural, será ampliado com novos conjuntos de informações, incluindo indicadores financeiros. Isso permitirá uma análise mais estruturada por parte de agentes financeiros e investidores, promovendo eficiência e segurança nas operações de crédito rural.
A medida busca fomentar a inclusão financeira no campo e apoiar práticas agrícolas mais sustentáveis.
6. Cooperativismo: fortalecimento da inclusão financeira regional
Com a entrada em vigor de legislação complementar, cooperativas de crédito poderão captar recursos de municípios — ampliando sua relevância para o desenvolvimento local.
Definição de limites e condições de captação
O Banco Central deve regulamentar os limites e condições para essa nova possibilidade. A expectativa é que as cooperativas se consolidem como vetores de inclusão bancária em regiões menos assistidas, promovendo maior circulação de recursos e parcerias com o setor público.
7. Organização e Acesso ao SFN: clareza e confiança na relação com os usuários
A diversidade de nomenclaturas das instituições financeiras ainda gera confusão entre os usuários quanto à natureza, regulação e escopo de atuação de cada entidade.
Padronização de nomenclaturas e identificação
O BC lançou uma consulta pública para propor uma norma de padronização de termos e nomenclaturas. A intenção é tornar mais clara a identificação das instituições autorizadas, fortalecendo a confiança e a transparência na relação com clientes e sociedade.
8. Conduta: medidas para um sistema financeiro mais seguro e confiável
Prevenção a fraudes
O BC trabalha na criação de um sistema que impedirá que terceiros abram uma conta corrente ou de pagamento em nome de pessoa que não tenha feito essa autorização. Essa consulta será realizada obrigatoriamente pelas instituições financeiras antes da abertura de qualquer conta, dificultando o uso indevido de dados e fortalecendo a proteção ao consumidor.
Revisão da regulação de tarifas bancárias
Diante das transformações vividas nos últimos 15 anos — com a chegada de fintechs, novos canais digitais e serviços personalizados —, o Banco Central iniciou a revisão da normativa que regula tarifas bancárias. O objetivo é atualizar a regulação às novas dinâmicas do mercado, promovendo mais equilíbrio competitivo e clareza para o consumidor.
9. Ativos e Produtos Financeiros: captação e garantias
Diante das mudanças nas fontes tradicionais de captação e da busca por maior segurança nas operações, o Banco Central coloca na pauta temas-chave como crédito imobiliário e novos modelos de garantias.
Crédito imobiliário: alternativas para um modelo em transformação
O sistema atual, fortemente apoiado pela captação por meio da Poupança, já demonstra sinais de esgotamento. Em um cenário mais volátil e dinâmico, o Banco Central propõe uma reavaliação do modelo de financiamento e dos contratos imobiliários, com foco em:
- Buscar novas fontes de captação mais sustentáveis;
- Avaliar formatos contratuais que ofereçam maior estabilidade para credores e tomadores.
A discussão permanece ativa na agenda de 2024, com o objetivo de tornar o crédito imobiliário mais resiliente e acessível.
Previdência privada como garantia
O marco legal das garantias permite que a previdência privada seja utilizada como garantia em operações de crédito. O BC se dedica agora a operacionalizar essa possibilidade, definindo os requisitos e infraestrutura necessários. A medida visa expandir o acesso ao crédito com menor custo, beneficiando consumidores e o sistema como um todo.
10. PIX: evolução contínua com foco em inclusão, segurança e experiência
O Banco Central mantém sua agenda evolutiva sobre o PIX com entregas relevantes e foco em usabilidade e inclusão financeira.
PIX por Aproximação
Facilita pagamentos no varejo físico, reduzindo fricções na jornada do consumidor. O recurso será incorporado ao regulamento do PIX, com lançamento previsto para maio de 2025.
MED 2.0
A nova versão do mecanismo especial de devolução permite rastrear e bloquear valores em mais etapas, aumentando a proteção contra fraudes.
PIX Parcelado
A padronização da experiência de pagamento parcelado trará mais clareza para o consumidor e incentivará o uso pelos lojistas, inclusive com possibilidade de descontos nos pontos de venda.
PIX em Garantia
Essa funcionalidade permitirá o uso de transações futuras como garantia de crédito, ampliando o acesso para empreendedores e pequenos negócios.
Essas iniciativas reforçam o compromisso do BC em posicionar o PIX como uma infraestrutura nacional de pagamentos moderna, segura e inclusiva.
11. Arranjos de Pagamento: modernização com foco em eficiência e segurança
Gerenciamento de riscos em arranjos pós-pagos
Com base na consulta pública 104, o BC está construindo um normativo robusto que reforçará as regras de risco nos arranjos pós-pagos, promovendo estabilidade e proteção sistêmica.
Revisão das tarifas dos arranjos pós-pagos
A agenda contempla o aprimoramento de tarifas como bandeiras e intercâmbio, alinhando o sistema às diretrizes da Lei nº 12.865, com foco em eficiência e equilíbrio competitivo.
Solicitantes de Token
A regulação de carteiras digitais que tokenizam cartões de crédito está sendo avaliada. O BC abriu uma tomada de subsídios para discutir se tais plataformas devem seguir regras específicas no âmbito dos arranjos de pagamento.
12. Infraestrutura de Mercado Financeiro: interoperabilidade e eficiência regulatória
A consulta pública 113 trata da limitação das tarifas de interoperabilidade cobradas entre registradoras de recebíveis de cartão. A medida busca:
- Reduzir custos operacionais;
- Evitar abusos na precificação entre registradoras;
- Ampliar o acesso aos dados com maior fluidez.
A resolução será publicada em breve e deve consolidar um ambiente mais equilibrado e transparente.
13. Fundos Garantidores: revisão para maior solidez sistêmica
O BC também revisa as normas relacionadas aos fundos garantidores, com foco em modernização e alinhamento a padrões internacionais. As mudanças buscam:
- Fortalecer a atuação dos associados;
- Avaliar, até 2026, a adequação do tamanho do Fundo Garantidor de Crédito (FGC), como previsto em lei.
Essa revisão contínua tem caráter preventivo, mirando resiliência e eficiência sistêmica.
14. Ação Sancionadora: evolução contínua do enforcement regulatório
PIX: manual de penalidades
O Banco Central continua revisando o manual de penalidades do PIX, ajustando suas diretrizes à evolução do sistema. A intenção é garantir clareza, previsibilidade e coerência nas sanções aplicadas, mantendo o bom funcionamento do ecossistema.
Rito do processo sancionador
A revisão periódica das regras do rito sancionador visa mais agilidade e efetividade nos processos administrativos, fortalecendo o papel regulador e a confiança no sistema.
O que essas tendências regulatórias exigem das instituições financeiras?
Mais do que prever mudanças, a agenda do Banco Central impõe ajustes estratégicos, operacionais e culturais às instituições. Veja algumas implicações práticas:
- Revisar modelos de negócio e produtos, considerando o avanço da tokenização, das BaaS e o aumento do consentimento ao Open Finance pelas Pessoas Jurídicas.
- Fortalecer a governança e compliance, com foco em IA responsável, ESG com métricas quantitativas e prevenção a fraudes.
- Investir em infraestrutura e interoperabilidade, diante da evolução do PIX, da agenda de pagamentos e da regulação de novos arranjos.
- Redesenhar processos de crédito, incorporando garantias mais modernas (como previdência).
Ao se adaptar mais rapidamente, as organizações que liderarem essa transformação estarão em vantagem competitiva no novo ciclo do setor financeiro brasileiro.
Na BIP, acompanhamos de perto esses movimentos e apoiamos as Instituições Financeiras na adaptação à estas mudanças, com agilidade, segurança e visão estratégica. Se sua instituição busca compreender o impacto das mudanças regulatórias e transformar esses desafios em oportunidades, fale com um de nossos especialistas.