No ano passado, a BIP Itália promoveu uma discussão com 22 CEOs de grandes empresas europeias para discutir o tema Inovação e Criatividade, com foco na importância da liderança para estimular a criatividade coletiva e implementar a cultura da inovação. Para incentivar este debate, contou com dois especialistas em liderança e inovação: Linda Hill, professora de Harvard e Greg Brandeau, ex-CIO da Pixar. Ambos são autores do livro “Collective Genius: The Art and Practice of Leading Innovation”.
Os executivos do encontro foram unânimes em afirmar que estimular a criatividade coletiva não é um processo simples. E, para que as organizações possam inovar constantemente, é preciso desconstruir as noções convencionais de liderança e incentivar a inovação como um tipo de solução colaborativa de problemas entre pessoas que possuem diferentes conhecimentos e pontos de vista.
Segundo a Professora Linda, o papel dos líderes na transformação das empresas deixou de ser apenas o de propor uma ideia ou visão e levar as pessoas a cumpri-la da maneira mais rápida e eficiente possível. Hoje, o papel do líder deve ser o de coordenar a criação coletiva dos funcionários da empresa em direção à inovação e diferenciação. Se a empresa está realmente tentando construir uma organização capacitada, é preciso auxiliar as pessoas a fazerem um trabalho inovador e que realmente faça a diferença para os clientes da organização.
Um outro ponto destacado pela Professora Linda Hill é que, geralmente, as organizações consideradas criativas e inovadoras são comunidades que possuem três características: abrasão criativa, agilidade criativa e resolução criativa.
A abrasão criativa significa a geração de ideias através do diálogo, do debate e do discurso entre pessoas da própria equipe, entre os funcionários e o chefe e até mesmo entre equipes diferentes. Organizações inovadoras amplificam a diversidade e o conflito saudável. Essas empresas sabem que argumentos fortes e construtivos são importantes para gerar uma gama de alternativas viáveis e soluções inovadoras para problemas complexos. Alimentar uma cultura forte de debate pautado em fatos e análise de dados cria um time muito mais preparado para colaborar entre si e repensar modelos atuais, pensando sempre na melhoria do negócio.
Sobre esse mesmo ponto, Greg Brandeau comentou que a abrasão criativa era um pilar importante no dia a dia da Pixar. Segundo ele, todos funcionários eram incentivados a dar opiniões e conselhos aos diretores sobre suas visões e pontos de vista. Basicamente, o pensamento da empresa é que ideias inovadoras só irão surgir se você as expor e abraçar outras ideias que são contrárias às suas. É preciso haver a diversidade e o conflito dentro das empresas para que as ideias sejam refinadas, a fim de criar um banco sólido repleto de novas visões.
A segunda característica, a agilidade criativa, consiste em poder experimentar e refinar as ideias por meio de iniciativas, reflexões e ajustes rápidos de rota. A utilização de metodologias como o Design Thinking, que coloca o cliente no centro da inovação, incentiva o desenvolvimento ágil de protótipos e permite o erro e rápida correção de rota, possibilitam um ritmo muito mais veloz de trabalho e engajam muito mais todo o time no processo de inovação.
Na Pixar, segundo Greg Bradeau, eles permitem que tudo seja aberto e possível de mudar, até que o trabalho esteja realmente finalizado e entregue. Essa abertura permite que o trabalho envolva muito aprendizado, improvisação, debate e desenvolvimento, resultando em um processo de inovação dinâmico, rico e ágil.
Já a terceira característica, a resolução criativa, está relacionada à tomada de decisão de forma que os funcionários possam combinar ideias diferentes e até opostas, com o objetivo de reconfigurá-las em novas combinações para produzir uma solução nova e útil para todos.
Organizações inovadoras não permitem que um grupo específico ou um indivíduo domine o debate de ideias e centralize a tomada de decisão, mesmo que seja o chefe ou um especialista no assunto. O grupo toma as decisões em conjunto, assumindo os frutos ou ônus das mesmas e buscando sempre a melhoria.
Além de propiciar um ambiente favorável à inovação, baseado nas três características descritas acima, o líder próprio precisa desenvolver comportamentos que estejam alinhados a esta cultura esperada.
Durante o encontro Greg Brandeau personalizou o líder de inovação na figura de Steve Jobs, com quem trabalhou durante anos na NeXT e na própria Pixar. Segundo ele, Steve Jobs possuía quatro comportamentos fundamentais que possibilitavam que a equipe inovasse de forma conjunta, ágil e eficiente.
Um líder de inovação procura críticas – Durante o processo seletivo para entrar na NeXT, Brandeau teve 4 dias de reuniões com várias pessoas da equipe para se preparar antes de chegar à entrevista com Jobs e conta que o encontro com Jobs durou apenas 10 minutos. Segundo ele, Jobs começou desenhando no quadro-negro para explicar como funcionava o sistema financeiro da empresa, mas ele não tinha os detalhes tão bem do sistema. Nesse momento, Greg passou a fazer perguntas, criticar e fazer sugestões de melhoria no modelo atual, que eram rebatidas por Steve Jobs. Após poucos minutos discutindo, quando Jobs percebeu que Greg não iria desistir das ideias e posições, Jobs falou que ele estava contratado e esperava vê-lo conduzindo parte das melhorias discutidas.
Um líder de inovação visa criar um senso de comunidade na empresa – Greg Brandeau conta que quando estavam preparando o Toy Story 2, houveram alguns problemas, que consumiram três dos quatro anos para completar o filme. O prazo para finalizar o filme era muito apertado e se não houvesse um grande esforço dos colaboradores, o mesmo não seria lançado na data prevista. Nesse contexto, Steve Jobs decidiu distribuir um bônus para toda a equipe – incluindo os colaboradores que trabalhavam na cozinha, guardas de segurança, time financeiro, etc. Como resultado, todos que trabalhavam na empresa sentiram que faziam parte da produção desse filme e sentiam a responsabilidade de ajudar os colegas no que pudessem. Esse senso de comunidade existe até hoje na Pixar, garantindo um alto nível de colaboração entre os colaboradores e facilitando toda e qualquer transformação ou projeto necessário.
Um líder de inovação sabe que os funcionários têm limitações – No começo, Steve não entendia que as pessoas não podiam trabalhar o tempo todo. As pessoas talvez tivessem filhos e precisassem cuidar deles. Então, quando ele também se casou e teve filhos, se tornou mais tolerante com os outros. Além disso, com a experiência, Steve passou também a tolerar melhor os erros cometidos pela equipe. Ele percebeu que as pessoas cometem erros, não porque são incompetentes, mas porque erros fazem parte do trabalho, ainda mais quando se está tentando melhorar algo fazendo de forma diferente. Esse comportamento do líder promove um ambiente propício à inovação, onde os colaboradores não têm medo de arriscar e mudar a forma de trabalhar com o intuito de melhorar um determinado processo, serviço ou produto. Eles sabem que não serão punidos e serão reconhecidos pelos seus esforços de inovação, mesmo quando não atingem o sucesso esperado.
Um líder inovador contrata pessoas melhores que ele – Líderes de inovação buscam sempre contratar as melhores pessoas possíveis, sem qualquer receio de serem passados para trás por estes em algum momento ou de perderem o comando. Segundo Greg, na Pixar havia muitos cérebros brilhantes, indivíduos multi-graduados e com uma grande experiência e carreira de sucesso. Pessoas brilhantes juntas conseguem fazer com que um ambiente de trabalho se torne cada vez mais inovador, desafio após desafio. A inovação não floresce de pessoas que seguem ordens de uma pessoa brilhante, mas sim de pessoas brilhantes trabalhando e colaborando em direção a um objetivo comum.
O encontro concluiu que a inovação é a chave para o sucesso e se torna, cada vez mais, uma questão de sobrevivência para as empresas. Ter profissionais que inovam dentro do ambiente organizacional é essencial para que a companhia consiga implementar suas estratégias e alcançar seus objetivos, e o papel dos líderes se torna vital em propiciar um ambiente fértil para essas pessoas.