Nos últimos anos, há um esforço intenso por parte das grandes empresas em acelerar iniciativas ligadas à transformação digital e inovação dentro de casa.
Um estudo da Innovation Leader, uma entidade americana dedicada a auxiliar as empresas a acelerar a inovação interna, entrevistou 170 empresas com faturamento acima de 1 bilhão de dólares e mostrou que 82% delas estão utilizando uma abordagem Lean Startup em algum aspecto de seus negócios.
Outro estudo da IESE, renomada escola de negócios global, afirma que, entre as 30 maiores empresas do mundo, o uso de incubadoras corporativas e aceleradoras internas de startups subiu de apenas 2%, em 2010, para importantes 44%, em 2016.
No entanto, apesar deste esforço em acelerar estas transformações dentro de casa, a realidade mostra que grande parte das empresas ainda não consegue enxergar ganhos reais e quantificáveis de tais iniciativas. Normalmente, os esforços despendidos acabam gerando produtos ou melhorias pontuais, que muitas vezes nem alcançam os clientes finais. Além disso, a cultura, as iniciativas, os métodos ágeis e as ferramentas de colaboração acabam não permeando toda a organização e possuem um efeito muito limitado a poucas pessoas ou áreas.
Essa dificuldade é facilmente compreendida quando pensamos que grandes empresas são em sua imensa maioria formatadas para maximizarem seus lucros no curto prazo e minimizarem seus riscos. Praticamente tudo em uma grande corporação, seus processos, sistemas e pessoas, estão formatados em direção a estes dois objetivos principais.
Entregar resultados de curto prazo acaba virando a prioridade máxima de qualquer gestor de uma grande empresa. Além disso, entregar resultados de curto prazo, na maioria das vezes, se traduz em repetir o mesmo que sempre foi feito e deu resultados no passado. Dan Schulman, CEO atual do Paypal, tem uma frase genial sobre como esse foco no curto prazo e a falta de inovação acabam minando os resultados futuros das grandes empresas: “O maior impedimento ao sucesso futuro de uma empresa é seu sucesso passado”.
Esse foco constante e imutável na geração de resultados de curto prazo e minimização de riscos acaba impactando na formação das equipes, já que os gestores preferem profissionais focados em executar atividades e processos existentes da maneira mais rápida e eficiente possível, minimizando bastante a presença de pessoas criativas e naturalmente inovadoras dentro das grandes empresas. Isto tem um impacto direto na cultura organizacional que acaba sendo moldada a evitar caminhos diferentes dos já conhecidos e recriminar erros cometidos decorrentes da atuação diferente dos livros de processos padrões existentes e controlados por áreas de processos e qualidade.
É por isso que esforços isolados em direção a aproximar grandes empresas da velocidade empregada por startups acabam falhando e decepcionando as lideranças das mesmas ao longo dos últimos anos.
Não estou dizendo que as empresas deveriam deixar de lado o foco na maximização de seus lucros e a mitigação de riscos. Esses são, e continuarão para sempre sendo, pilares importantes para sua perpetuação.
No entanto, é preciso considerar que empresas que não inovam terão esses dois pilares afetados no futuro pelo surgimento de novos modelos de negócio e concorrentes que não estão hoje no radar. Isso acontece em praticamente todos os segmentos de negócio, como preconizado por Joseph Schumpeter em 1942 em seu conceito de “Destruição Criativa”, que coloca a inovação como força motriz do crescimento econômico.
Grandes empresas que conseguem avançar e acelerar a cultura de inovação dentro de casa normalmente buscam intensificar o olhar para o que acontece ao seu redor, e até mesmo em outros mercados, e remover as barreiras internas existentes à inovação.
Em primeiro lugar, olhar para fora garante uma visão diferente da que a empresa está acostumada. Ter acesso a novos modelos de negócios existentes, novos meios de monetização de serviços, novos modelos de gestão, novas ferramentas e sistemas, entre outros, traz insights e ideias fundamentais para a ignição do processo de inovação e transformação.
Uma maneira efetiva que as grandes empresas têm experimentado para olhar para fora é fazer parte do ecossistema de startups existente hoje no Brasil. Estar próximo às startups coloca a empresa em contato direto com um mundo bastante diferente, onde não existem, a princípio, lucros a serem maximizados, mas novos negócios a serem construídos, e muitas vezes do zero.
Essa aproximação com startups pode acontecer por diferentes modelos, desde os mais simples que buscam apenas o contato com esse ecossistema, até os mais integrados que culminam na potencial aquisição dessas empresas. Os quatro principais modelos de aproximação são:
- Presença em espaços de coworking – A simples presença de uma grande empresa nesses espaços já aumenta a sua percepção sobre novos modelos de negócios que estão surgindo e a forma de trabalhar das startups.
- Desafios abertos a startups – Organizar competições abertas a startups para resolver desafios específicos acelera a solução de problemas internos e pode engajar os times internos em seus esforços de inovação.
- Cliente de risco – Tornar-se o primeiro cliente de um produto ou serviço oferecido por uma startup coloca o time interno da grande empresa em contato direto com um ambiente de desenvolvimento ágil e com foco na resolução de problemas, ajudando na disseminação dessa cultura.
- Aceleradoras corporativas – Criar um programa estruturado para acelerar o desenvolvimento de startups, incluindo a oferta de aconselhamento, formação e investimento, pode abrir ótimas oportunidades de troca de experiências e até aquisição estratégica de algumas dessas empresas aceleradas
Outra maneira efetiva de trazer um olhar externo para solução de problemas internos pode ser a utilização de plataformas de open-innovation. Por exemplo, a Henkel, uma das maiores indústrias químicas do mundo, tem utilizado a plataforma Jovoto para alguns de seus projetos internos de inovação. A Jovoto conta com mais de 100.000 profissionais com ampla experiência em projetos de design, experiência e tecnologia em cerca de 153 países. O papel da plataforma é ligar o desafio da empresa aos profissionais certos que poderiam contribuir para a construção da solução. Segundo a Henkel, já foram implementados 27 projetos em conjunto com a Jovoto, resultando em aproximadamente 90 patentes registradas.
A remoção de barreiras é o outro elemento fundamental para a aceleração da inovação em grandes empresas. Uma forma simples que as empresas têm encontrado é a criação de um canal direto entre colaboradores que possuem ideias inovadoras e um time executivo focado em inovação. Ter esse canal direto propicia que boas ideias cheguem à direção da companhia sem esbarrar em processos burocráticos, limitações sistêmicas ou desencorajamento de superiores diretos.
Um bom exemplo de grande empresa que implementou esse canal direto é a gigante de telecomunicações americana AT&T. Em 2009 ela criou um programa chamado “The Innovation Pipeline” no qual qualquer colaborador da companhia pode contribuir com ideias. As ideias são apresentadas pelos próprios colaboradores em comitês trimestrais, nos quais são selecionadas as melhores e que receberão apoio e investimento para o desenvolvimento dentro da empresa. Segundo a empresa, em cinco anos foram avaliadas mais de 28.000 ideias, foram investidos mais de 40 milhões de dólares e foram geradas inúmeras patentes importantes que contribuem para o sucesso da companhia.
A geração de canais diretos à inovação contribui, ainda, para elevar o engajamento de colaboradores com instinto empreendedor que poderiam em algum momento deixar a companhia devido à falta de espaço para colocar suas ideias em prática.
Além disso, é preciso promover e incentivar os comportamentos empreendedores dos colaboradores, criando incentivos financeiros ou reputacionais à geração de ideias que possam se transformar em transformações importantes para a companhia.
Os incentivos financeiros podem compor a remuneração variável dos colaboradores, e até mesmo dos líderes da companhia e devem estar atrelados tanto à geração de boas ideias quanto ao resultado alcançado pelas mesmas.
Outra forma de reconhecer os esforços voltada à inovação é criar eventos semestrais ou anuais que premiam as melhores ideias que evoluíram para a projetos e contribuíram de alguma forma para a companhia. A divulgação desses projetos e o reconhecimento público das pessoas envolvidas nos mesmos promove uma cultura que aceita e incentiva a tomada de riscos calculados em direção a inovações que possam trazer resultados importantes para a companhia no futuro.
Intensificar o olhar ao mundo externo à empresa e remover as barreiras internas à inovação são importantes, mas precisam vir em conjunto com um grande patrocínio e confiança da alta liderança da empresa. Inovações disruptivas não trazem resultados no curto prazo e a liderança precisa ser resiliente o bastante para aceitar e conviver com os fracassos no meio do caminho.
Grandes empresas normalmente possuem força e resiliência para enfrentar turbulências de mercado e novos entrantes, mas a história conta com diversos exemplos de companhias que sucumbiram por não conseguirem inovar e transformar seus modelos de negócios.
Em um mundo onde as novas tecnologias estão cada vez mais acessíveis e pequenos grupos de pessoas estão revolucionando mercados através da inovação, não existe outra forma de sobreviver a não ser se tornar um dos disruptores.
Prepare-se! Não existe caminho de volta!